Conto de Natal - Livro Digital

Textos Criativos

Palavras...

Uma folha branca espera pacientemente sobre a secretária. Em silêncio, aguarda que um dos meus muitos lápis roídos a preencha, a grafite delineando letras, depois palavras, no fim um texto. O vento silva na minha janela, as árvores, agora pintadas de tons quentes, dançam a primeira valsa de Outono. O ar traz um subtil cheiro a musgo e a terra molhada pela chuva e o sol parece tímido, encoberto por farrapos brancos que têm o nome de nuvens.
“Palavra preferida. Um tema simples, fácil até” - pensei. Porém, quando me debrucei sobre a folha nua para lentamente a ocupar, o lápis petrificou-se na minha mão. Havia tantas, tantas palavras que eu gostava. Como” veludo”, que me fazia lembrar o pêlo macio de um gato sonolento, uma infusão fumegante de camomila bebida junto a uma lareira crepitante. Mas também havia “mar”, e “céu”, e “sonho”. E “música”. Blues e jazz, rock, pop, punk e gothic. E havia ainda “tempo”, “pensamento” e “família”. Seria assim tão difícil escolher uma palavra, quando a nossa vida está repleta delas?
“Solidão”. A palavra agradava-me, uma velha e leal amiga que nunca me havia deixado só. Havia-me amparado, enrolado no seu manto felpudo, fazendo com que esquecesse por momentos a vida, o real, o mundo. Deixando-me apenas entre o nada e coisa nenhuma, a solidão tinha sido das palavras a quem mais devia favores nas páginas mais dramáticas da minha curta vida.
“Fantasia”. Sempre risonha, esta palavra já faz parte de mim. Quando a ilusão se apodera dos nossos sentidos, há que combatê-la com mais ilusão, só que feliz. Uma ilusão muito mais feliz.
“Comunicação”. Talvez a palavra mais importante de toda a minha existência. Palavras, frases, capítulos, livros. É através da comunicação que se contam histórias, escrevem livros, se difundem informação, se espalha o conhecimento. É ela que me preenche os vazios, as noites passadas rasurando folhas, folhas e mais folhas.
Podia mencionar dezenas de palavras. Centenas até. Não escolheria nenhuma. Poderia dizer que gosto de “pássaro”, porque me lembra a liberdade, que gosto de “sonho”, porque me lembra esforço e futuro. Porque tudo é feito de instantes, cada um tem uma palavra que os define. E a existência é tão cheia de instantes! Não adianta lembrar-me de mais palavras. Porque eu queria uma palavra onde coubesse “livros”, “mar”, “dedicação”, “teatro”, “Supernatural”, “amizade”. E que tivesse ainda espaço para “escrita”, “teatro”, “punk rock”, “Setembro”, “mistério”, “Green Day” e “dedicação”.E para “chuva”, “café” e “desenho”. Queria uma palavra que me descrevesse, que descrevesse o meu mundo. Não me peçam para escolher uma só palavra, porque não conseguirei. Não mo peçam para o fazer porque uma história é feita não de uma, mas de muitas palavras. Eu queria uma palavra onde tudo isto coubesse, e ainda houvesse espaço para mais algumas. Espere! Já sei. A minha palavra é “vida”.
Catarina Almeida, 10º A; 1º trimestre - 2010

0 comentários: